Estamos perdendo o controle?

Por Tiago Duran *

Ontem eu parei para entender melhor essa nova onda de protestos nos EUA, que reacenderam após mais uma ação policial que resultou em um jovem negro baleado.

Assistindo aos dois vídeos que achei na internet e lendo alguns depoimentos, acho que houve uma falha na gestão da situação e na tentativa de assumir o controle por parte dos agentes envolvidos. 

Pelo que li, os policiais foram chamados para atender uma ocorrência de briga doméstica e se envolveram em uma luta com o jovem. 

Nos vídeos podemos ver que o jovem não é imobilizado e consegue se livrar dos policiais. Após isso, mesmo com ordem para não se mexer, ele se dirige até o carro, abre a porta e faz um movimento como se fosse pegar algo. Nesse momento, os policiais reagem e disparam vários tiros. 

Prepare-se para assumir o controle

Quero analisar a situação como um exemplo de evento/crise a ser gerenciada. 

No papel do policial que foi chamado para atender a ocorrência, o que você faria?

Sua abordagem inicial não funcionou, as coisas começaram a ficar mais críticas, as reações te colocaram em risco, seu plano não previa esse nível de criticidade e/ou você não estava bem preparado, e tudo isso resulta em uma resposta desesperada, que freia a confusão mas resulta em consequências piores do que o fato em si. 

Qual seria a sua reação no momento em que a situação estava a beira do caos e oferecia um aparente risco a sua integridade e dos demais em volta?

Arriscaria, esperando para ver se o risco iria se materializar, ou reagiria para evitar isso e preservar a segurança de todos?

Quando falamos em negócios, algumas perdas são aceitáveis, mas quando falamos de vida, as prioridades mudam. 

Uma vez fui parado pela polícia quando estava dirigindo na estrada. Recebi o sinal pra parar, encostei o carro e esperei o policial chegar. Querendo adiantar o processo, quando ele chegou perto eu me movimentei para pegar a carteira que estava no porta objetos da porta.

Foi a pior coisa que podia ter feito.

Tomei um grito de “NÃO SE MEXE E DEIXA AS MÃOS ONDE EU POSSO VER” na orelha, que quase pedi desculpas por existir e estar ali incomodando ele. Depois disso, ele abriu a porta, viu que não tinha nada que oferecia risco no porta objetos e seguimos com o procedimento normal. Ele me orientou a nunca fazer isso que fiz, nem diante de um policial nem diante de um bandido, porque, dependendo da tensão envolvida, eu poderia estar colocando em risco o controle da situação que o policial/bandido aparenta ter. 

O policial sabe dos riscos aos quais está exposto. Todas as situações onde ele é acionado são situações de crise ou potenciais crise.

Assumir o controle logo de cara facilita a gestão da situação. Quanto mais você demora para assumir o controle e responder, mais crítica a situação vai ficando, mais duras serão as respostas e piores serão as consequências. 

No caso que deu origem a esse artigo, os policiais chegaram com um plano de ação pronto, quando tomaram conhecimento do real problema, perceberam que era maior do que esperavam, talvez o plano inicial não daria conta, não estavam preparados ou não souberam agir dentro do planejado, as tentativas de respostas alternativas não surtiram efeito e acabaram cedendo ao desespero.

Nesse caso, envolvendo o risco às vidas presentes, falou mais alto o instinto do que a razão. 

Quando falamos dessas ações policiais, vários fatores podem estar influenciando a má gestão das ocorrência para onde são acionados: peso da repercussão de ações anteriores, medo de ser o próximo caso nas mídias, falta de preparo emocional, abuso por parte dos cidadãos comuns, etc.

A falta de uma abordagem inicial correta, incisiva e bem planejada torna difícil tomar o controle do evento em curso. E essa falta de controle faz com que as reações seja tomadas tardiamente, durante os momentos mais críticos, onde os ânimos estão mais exaltados. 

Uma coisa que aprendi nas crises em que participei e naquelas que estudei é, numa crise, o quanto antes você tomar o controle da situação, melhor vão ser as suas reações. Assumir o controle o mais rápido possível, acalma os envolvidos e opinião pública, traz confiança e diminui a tensão.

Se demorar pra assumir o controle, as reações sairão no desespero e o resultado não será bom. Os envolvidos ficam cada vez mais tensos, a confiança despenca e a opinião pública “te janta”. 

Para ter essa habilidade você precisa ter:

  • cenários e riscos mapeados;
  • planos de resposta, contingência e crise;
  • treinamento e exercícios constantes. 

Se prepare.

Estar bem preparado e familiarizado com seus planos e recursos disponíveis é fundamental.

* Tiago Duran é especialista em Gerenciamento de Crise e Continuidade de Negócio

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